terça-feira, dezembro 27, 2016

Direito de manter bens e ativos no exterior




Dinheiro privado não é dinheiro público. Dinheiro privado é parte integrante do patrimônio do seu titular.
Assim, qualquer pessoa física ou jurídica residente ou estabelecida no Brasil pode manter ativos financeiros e outros bens no exterior. Esse direito decorre de garantia constitucional.
Esses ativos no exterior podem ter distintas origens. Podem ser fruto de doação, de herança, de venda de bens, de aquisição de bens e direitos e de prestação de serviços.
Esses ativos podem também ser resultado de meras transferências financeiras do titular para si mesmo, a partir do território brasileiro. Nesse sentido, qualquer pessoa aqui domiciliada, residente ou estabelecida pode ir a seu banco e ali dar instruções para a efetuação da operação cambial indicando sua conta bancária no exterior, que receberá os valores assim transferidos. Não há limites para essa operação.
Uma vez no exterior, esses recursos financeiros podem ter a destinação que lhe seja dada por seu titular. Só a ele cabe decidir o que fará com seu dinheiro.
Essa transferência se faz a título de manutenção de disponibilidade financeira no exterior.
Os valores oriundos do Brasil que aqui já tenham sido tributados podem ser livremente transferidos ao exterior sem sujeição de impostos, à exceção do IOF devido no ato do fechamento do contrato de câmbio, quando transferidos a outros países.
Como indicado acima, esses ativos no exterior nem sempre resultam de saída de recursos financeiros do território brasileiro. Podem ter tido origem no próprio país estrangeiro.
Nesse caso, o recebimento desses valores no exterior, acrescendo ao patrimônio do beneficiário, fica sujeito à tributação no Brasil, como qualquer outro rendimento que houvesse sido gerado internamente no País.
Efetuado o recolhimento do Imposto de Renda sobre esse acréscimo patrimonial, ficará ao exclusivo critério de seu titular se manterá no exterior esses recursos financeiros, ou se promoverá seu ingresso no Brasil, por meio de operação cambial procedente do exterior.
Ativos ocultos no exterior
Vamos considerar como ocultos no exterior aqueles ativos recebidos por seu titular, que lá permanecem sem inclusão na sua declaração de bens ou na contabilidade da empresa estabelecida no Brasil.
Regularização desses ativos
A regularização desses ativos junto ao Fisco brasileiro pode ser realizada a qualquer tempo, mediante denúncia espontânea do contribuinte como autorizado pelo artigo 138  Código Tributário Nacional. Evidentemente, haverá aí incidência de juros de mora e de correção monetária
Ativos inferiores ou superiores a US 100.000,00
No caso de ativos que, ao final de cada ano, sejam equivalentes a menos de US$ 100.000,00 (cem mil dólares americanos), o titular desses ativos fica dispensado de comunicar ao Banco Central do Brasil essa disponibilidade financeira no exterior.
Inversamente, essa comunicação deverá ser feita dentro do prazo legal no ano subsequente, sob  pena de multa e de processo penal sob a acusação de evasão de divisas.
Esse processo penal resulta simplesmente dessa omissão, mesmo que o titular desses recursos financeiros os tenha oferecido à tributação pelo Imposto de Renda.
A evasão de divisas
Isso pode acontecer em relação a quaisquer pessoas em quatro hipóteses: a) quando tenham feito transferências financeiras ao exterior sem utilizar-se de regular operação cambial; b) quando saírem do País portando mais de R$ 10.000,00 em espécie (ou seu equivalente em moeda estrangeira) sem apresentar Declaração de Porte de Valores (DPV) na saída; c) quando, mesmo valendo-se de regular operação cambial por meio de instituição autorizada a operar com câmbio, esses valores ao final de cada ano, superarem  US$ 100.000,00, sem comunicar ao Banco Central do Brasil, no ano subsequente, o saldo desses valores em 31 de dezembro do ano anterior, e d) quando recebam, diretamente, no exterior e lá mantenham, valores superiores a US$ 100.000,00.
Crime consequente
Grave consequência de ter-se uma condenação criminal por evasão de divisas é ver-se, também, condenado por crime de lavagem de dinheiro, como crime consequente da própria alegada evasão.
Assim, se a única causa de eventual processo e condenação por lavagem de dinheiro for a condenação por evasão de divisas, o crime consequente só deixará de existir, se o da evasão de divisas for julgado inexistente.
Possibilidade de defesa
A inexistência de crime de evasão de divisas ou decorrerá da prova de que não houve a configuração fática da alegada evasão, ou decorrerá de uma outra possibilidade de defesa.
Essa outra possibilidade de defesa está em impetrar  habeas corpus para o trancamento da ação penal ainda sem sentença, para a cassação da sentença condenatória, se já proferida, ou para a revisão criminal, no caso de condenação com pena em andamento ou mesmo já cumprida.
O autor deste artigo, depois de profunda análise em torno do tema, chegou à conclusão de que o tipo penal denominado "evasão divisas" é inconstitucional.
Desse modo, os fundamentos de qualquer habeas corpus, nesses casos, não podem nem devem ficar limitados à demonstração de conduta atípica do acusado, demonstrando não ter incidido em qualquer das quatro hipóteses de configuração desse crime. Mais do que isso, será preciso argumentar e fundamentar judicialmente que, mesmo que houvesse incorrido em quaisquer dessas quatro hipóteses, deveria ser absolvido exatamente porque o tipo penal é inconstitucional.
Fica, aqui e portanto, essa recomendação  como meio de defesa do acusado.
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Dr. Plínio Gustavo Prado Garcia  é membro efetivo da Comissão Especial de Direito Penal Econômico da OAB/SP e sócio-fundador de Prado Garcia Advogados com escritório em São Paulo, Capital - Fone (11) 3242.8799 - e-mail: advocacia@pradogarcia.com.br; blog: www.locuslegis.blogspot.com